Oficina Literária

Oficina Literária é uma disciplina do TEL ministrada pela professora Elizabeth Hazin

segunda-feira, 23 de março de 2009

Texto da Manuela

Nadadora

Comecei a nadar aos seis anos de idade, quando, depois de várias consultas a inúmeros médicos, a natação foi a solução encontrada por meu pai, para as minhas freqüentes crises asmáticas. Nós morávamos em uma pequena cidade praiana do estado do Rio de Janeiro chamada Araruama, localizada a pouca mais de 110 km da capital.

Meu pai era um humilde e simpático pescador, que conquistava qualquer um com quem conversasse. Me lembro que ele chegava sempre após o pôr-do-sol com sua canoa e a rede nas mãos. Eu o via pela janela lá de casa, que ficava em cima de um morro, de onde se tinha uma belíssima vista da praia, dos outros morros detrás do oceano e do céu. Eu sempre o esperava ansiosa. Havia sempre uma surpresa pra mim: podia ser um peixe de cores que eu jamais havia visto, ou algo que ele fingia ter pego no fundo do oceano (embora eu soubesse que havia pego na praia mesmo).

De longe, os presentes que eu mais gostava eram as águas-vivas. Eles as trazia em baldes e as colocava na minha mão, me ensinando como pegá-las sem que me queimasse. E quando me pegava admirando-as, dizia que eu deveria ser como elas, graciosas, encantantes, reservadas. Deveria, principalmente, ter o seu fôlego. Contava que, na verdade, elas eram seres terrestres, mas amantes da água o suficiente para passarem a maior parte do seu tempo dentro da água, indo de vez em quando para a areia respirar um pouco. Eu, pequena, acreditava em tudo o que aquele homem, pra mim tão sábio, dizia.

Naquela época, eu quase não saía de casa devido aos meus problemas de saúde. Meu pai, porém, me trazia o oceano todos os dias depois do pôr-do-sol. Aquilo era suficiente pra me deixar com um desejo imenso de ir, eu mesma, atrás daqueles objetos, daqueles tesouros e animais que eu ganhava. Ficava horas imaginando como seria o mundo debaixo das águas verdes do mar que eu só conhecia pela minha janela.

Um belo dia, meu pai decidiu que eu deveria nadar. Dizia ele, seu coração lhe indicava que aquilo me curaria da asma. Convencemos, com muita insistência, minha mãe de me deixar ir pescar com meu pai. Ele não me permitia mentir para ela, mas essa era uma causa muito nobre e sabia que se disséssemos a verdade, nossos planos iriam por água abaixo. Foi então que, em seus braços, mergulhei meu corpo pela primeira vez no mar. Me lembro claramente de cada emoção sentida, do pulsar rápido do meu coração, da alegria, da empolgação e da falta de ar mais feliz que eu havia tido. Perder o fôlego era apenas mais uma entre as milhões de sensações que eu sentia. Era incrível imaginar que eu pudesse estar junto de todos os maravilhosos seres que meu pai me trazia. Podia tocá-los, queria vê-los, sentir seu cheiro. Nesse momento, eu passava a ser um deles. Finalmente havia me transformada na água-viva.

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